Você sabia que Dom Pedro I visitou Congonhas?
Neste ano de 2022, comemoramos o Bicentenário da Independência do Brasil, efeméride importante que deve ser festejada com muito orgulho por todos nós, brasileiros.
Assim sendo, acho oportuno relembrar um fato histórico pouco conhecido pelos congonhenses: a memorável visita de dom Pedro I e da imperatriz dona Amélia em Congonhas do Campo.
No livro Urzedo e a medicina do Brasil Imperial: o pioneirismo de um congonhense, publicado em 2019, relatei com detalhes sobre o dia em que a família imperial visitou a “Cidade dos Profetas”.
Infelizmente, a visita dos monarcas não é mencionada em nenhum dos livros sobre a história de Congonhas, e são raros, como o Atlas Escolar: Histórico e Geográfico de Congonhas, referências bibliográficas do município. À vista disso, transcrevo abaixo parte do capítulo “Dom Pedro I visita Congonhas do Campo”:
“[...] O descontentamento extravasava os limites da Corte. Assim, no começo de 1831, acompanhado da esposa, a imperatriz Amélia, dom Pedro I foi buscar apoio em Minas Gerais. Visitou diversas localidades: São José do Rio das Mortes (atual Tiradentes), São João del-Rei, Lagoa Dourada, Olhos d’Água, Cachoeira, Rio das Pedras, Santo Antônio do Rio Acima, Morro Velho, Sabará, Caeté, Brumado, Nossa Senhora Mãe dos Homens, Catas Altas, Mariana, Ouro Preto e São Brás do Suaçuí. O acolhimento dos mineiros não foi nada amigável. Sinalizava a insatisfação geral com o imperador. “Foi recebido com sinos dobrando a finados em Ouro Preto”, registrou João Camilo. Entretanto, na terra natal de Antônio Américo de Urzedo, a receptividade foi extraordinária, bastante calorosa!
O dia 26 de janeiro de 1831 foi uma data histórica! Às oito horas da manhã, o imperador dom Pedro I e a imperatriz Amélia chegaram em Congonhas do Campo. Seguiram para o “colégio de Matosinhos de Congonhas do Campo”, administrado pela Congregação da Missão, dos chamados padres lazaristas, onde foi recebido “com um vivo entusiasmo, não só dos habitantes do colégio, mas ainda de inumeráveis pessoas de todas as classes, que concorreram testemunhar a Suas Majestades os seus respeitos e homenagens”.
Nas ruelas de Congonhas foram colocados, com “maior asseio e elegância”, belíssimos arcos floridos para a passagem dos ilustres visitantes. Próximo ao colégio foi construído um palco para que o monarca oficializasse a chegada, e onde os membros da Câmara do distrito e todo o clero já o esperavam. “Era construída em forma octógona regular, armada de guaritas, bastiões, sentinelas, canhões, e no meio da esplanada se elevava um castelo de forma mourisca, no centro da qual estava arvorado um grande mastro”. Assim que o monarca chegou ao local, após ter saído do colégio, a bandeira nacional foi erguida num grande mastro, ato seguido por um tiro de bomba, “que imitava o de canhão”.
Dom Pedro e dona Amélia beijaram a cruz e foram aspergidos com água benta pela superior do colégio, que usava uma solene pluvial. Em seguida, iniciou-se uma procissão. O casal imperial caminhou sob um pálio, acompanhado pelos padres, estudantes e moradores da freguesia. Um cortejo festivo, conforme descreveu o jornal "Império do Brasil":
“Logo as girândolas de fogo, repiques de sinos, imensidade de fogo do ar, e uma Salva Imperial de cento e um tiros, (imitantes ao de canhão) no meio de continuados, e altos vivas do imenso povo, que ao mesmo tempo espalhava flores sobre Suas Majestades, e isto pelo meio de um jardim continuado, tornava um ato o mais luzido, e entusiasmado, que esta terra tem visto”.
No princípio da escadaria da igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos foi erguido um pórtico. No alto deste estavam as Armas do império. Nessa época, diferente de quando do nascimento de Antônio Américo de Urzedo, já existia na frente da igreja os doze profetas em pedra-sabão, esculpidos pelo mestre do barroco brasileiro, Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Os monarcas e demais participantes do cortejo passaram pelo pórtico e se dirigiram ao interior da igreja, onde fora montado um trono. Sentados, ouviram solenemente a execução do belíssimo hino Te Deum, acompanhado por uma “Orquestra de Música” da localidade.
Em seguida, o imperador e a imperatriz foram conduzidos à casa que tinha sido preparada para eles pelos padres do colégio. Mas logo voltaram para o salão do educandário. Debaixo do dossel, cumpriram o solene “beija-mão”.
Ao final da cerimônia, o imperador manifestou-se com entusiasmo para conhecer as instalações do colégio. Visitou o refeitório, o armazém dos viveres, assistiu aula e quis saber informações sobre a ordem dos estudos. Mais tarde, conheceu as obras, o jardim e a parte do santuário, que ainda não tinha visto. Após, assistiram aos “engraçados festejos de danças” e amostra de músicas oferecidas pelos congonhenses. “Ouvindo-se neste tempo repetidos e entusiasmados vivas daquele imenso povo, em cujas ações se divisava uma admirável candura, e patriotismo o mais decido”, anotou o diarista do Diário Fluminense.
Dom Pedro recebeu uma comissão da Câmara de Mariana. Depois um grupo de 24 alunos o convidou a participar de um espetáculo com alunos poetas, os quais estavam desejosos em “expressar a grande honra e satisfação, que lhes resultava desta Imperial visita”.
Quando chegou ao salão do colégio, que “estava ornado do melhor modo possível”, o imperador, após subir ao trono, ouviu um discurso proferido pelo superior do educandário. Depois escutou, atentamente, o recital dos alunos poetas, intercalado com apresentações musicais. “Em tudo isto mostrou Sua Majestade a maior satisfação, chegando a tanto o seu regozijo, que se dignou de dar também um mote de Viva a Pátria, o Povo, a Lei”, registrou o Diário Fluminense.
Outro aluno proferiu uma poesia. Mais uma vez o imperador não conseguiu conter “a satisfação de que estava transportado”. Para mais, assegurou ao colégio que mandaria imprimir todas as obras poéticas recitadas pelos alunos. “Também mandou, que se ordenasse uma relação mais circunstanciada, desde o ponto em que avistou o Colégio, onde principiou o regozijo da imensa multidão, que o esperava, até o momento de seguir sua viagem”.
Antes de partir, dom Pedro I fez uma doação à matriz de Nossa Senhora da Conceição, na qual Antônio Américo de Urzedo tinha sido batizado em 1786, e também aos pobres, e pediu ao vigário que distribuísse as esmolas aos moradores. No dia 27 de janeiro, às cinco horas da manhã, a comitiva imperial partiu de Congonhas do Campo. Pena, que essa visita histórica seja um fato desconhecido pelos congonhenses".
Paulo Henrique de Lima Pereira
Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Congonhas (IHGC), da Academia de Ciências, Letras e Artes de Congonhas (ACLAC) e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette (ACLCL)
Comentários
Postar um comentário